Quando cheguei na Jovem Pan no dia 3 de Novembro de 1989 um dos que me receberam com maior carinho foi Orlando Duarte. Praticamente foi meu cicerone juntamente com o falecido José Carlos Carboni, de tantas saudades e boas memórias.
Foi ele que poucos dias antes nas escadaria do Mineirão chegando com José Silvério e Wanderley Nogueira, me perguntou: “E, aí, tudo bem?Por que está triste?”. Eu não estava triste, estava cansado demais, vários meses sem férias, salários achatados pelos planos econômicos com inflação galopante e um gatilho de aumento a cada 3 meses que nunca chegava à minha conta. Muitas viagens seguidas com duas filhas para criar e sem poder ficar em casa nunca.
Para se ter uma ideia, eu tinha pedido um fim de semana para viajar com a família depois de 5 meses praticamente sem folga e o Edson Scatamachia entendeu que era justo mesmo. Pois no dia da viagem, Osmar Santos me ligou e pediu para ir a Montevidéu para fazer o jogo da classificação do Uruguai contra a Bolívia porque a TV Record tinha comprado os direitos do jogo e os demais repórteres estavam escalados nas transmissões da Rádio.
Lá fui eu com a promessa de que na volta eu teria uns dias de descanso. Voltei na segunda e na terça embarquei para Belo Horizonte para fazer São Paulo x Atlético Mineiro. Foi lá que me transferi para a Jovem Pan. Respondi calmamente assim para o pessoal da Pan: “Olha, não tem um lugar lá para mim? Sei que o Carlos Lima está saindo para a Rádio Globo. Vai sobrar uma vaga de repórter”. A princípio eles não acreditaram, eu fazia os principais jogos na Record, fiz todas as Eliminatórias e iria cobrir o Brasil na Copa da Itália. Topei assim mesmo ganhando apenas 500 cruzados a mais e saí um dia depois da Record ser vendida para o Edyr Macedo, mas essa é uma outra história para um outro comentário.
Lembro do Tatá Muniz, grande repórter da TV Bandeirantes e meu amigo até hoje, me dizendo: “Você é louco, era do primeiro time da Record e vai para a Jovem Pan. Lá você não vai viajar nunca mais”, quase que respondi: “No meu atual estágio não seria tão ruim”. Hoje ele diz que fiz a escolha certa, a Record não durou muito mais, já estava em crise. E pela Pan fiz Copas do Mundo, mundial de clubes e em três meses subi para o Primeiro Time e de 90 até 2016 fiz todas as grandes decisões de Paulista, Brasileiro e Libertadores envolvendo times brasileiros. Não posso reclamar, deu certo.
Orlando foi peça importante nisso. Naquela época parece que os jovens, e eu era mais jovenzinho, ouviam mais os veteranos que nos passavam esperanças e até objetivos. Mostravam o caminho que a gente podia escolher. Orlando saiu da Pan justamente porque foi cortado da Copa da Itália por conta do Plano Collor, que ferrou muita gente nesse país e nunca foi ressarcido a contento. Foi para a Rádio Trianon acreditando num novo Projeto, mas jamais nos distanciamos.
Não fui de frequentar sua casa, mas nos encontramos em almoços felizes e no Café do Consta, ali embaixo da Pan. E há dois meses estive lá com o amigo Constantino e perguntei do Orlando, fiquei sabendo que estava com Alzheimer e que a situação estava difícil. Essa doença é cruel demais especialmente para os familiares. Hoje li uma matéria em que a Conceição, esposa do Orlando, fala sobre a situação. Por isso resolvi escrever essas linhas. Não me senti no direito de falar antes já que a própria família não tinha interesse em divulgar nada. Era um direito da Conceição, dos filhos e parentes do grande Orlando Duarte.
Tive a sorte de trabalhar com grandes comentaristas como Loureiro Júnior, Sérgio Cunha, muito influente na minha maneira de trabalhar até hoje, Celso Martinelli, que é simplesmente excepcional, Flávio Prado, amigo irmão e profundo conhecedor de futebol e comunicação, Mauro Nobrega, simples e profundo conhecedor da matéria, e a Enciclopédia Orlando Duarte, um dos caras mais cultos que conheci. Grande escritor, sempre contando grandes histórias e talvez seja o jornalista que mais tenha visto Pelé jogar. Ele acompanhou centenas de excursões do Santos e seu livro sobre o Rei do Futebol é um retrato/depoimento vivo de quem foi o maior Camisa 10 que já existiu. A sua amizade com Pelé vem de décadas. Sem falar que viveu de perto todos os grandes momentos do futebol brasileiro. Da época que se jogava, não reclamava e ganhava.
Orlando Duarte merece o meu maior respeito e gratidão. Ele não sabe quanto me ajudou, mas eu sei. Força, Orlandão. Parabéns pela sua dedicação, Conceição. Lição de vida para todos nós.
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